Notas de Campo, Cadernos em torno de processos e práticas performativas.
Fieldnotes, Notebook on processes and performative practices.
Número duplo da revista Interact (http://interact.com.pt/category/28/) sobre pensamento, processos e práticas performativas
Organização: Sílvia Pinto Coelho e Cláudia Madeira
The Mind is a Muscle é o título de uma peça (1966) e de uma soirée performativa (1968) propostas por Yvonne Rainer em Nova Iorque. No programa da soirée, Rainer faz uma declaração de princípios onde revela o seu mal-estar em relação a uma sociedade que é cada vez mais «do espetáculo» e dos media. Com a tomada de consciência de que pode simplesmente desligar a televisão logo após assistir ao assassinato de um vietnamita, no mesmo contexto televisivo em que muda o canal para não ver um mau western, a coreógrafa reage com horror e incredulidade, pensando na «mente», ou no espírito, enquanto «músculo atrofiado» que pode ser estimulado.
Paralelamente, nesta proposta de Rainer, está subjacente o propósito de desafiar um certo padrão instalado na dança moderna americana. Anos antes, o seu manifesto do «não» – ou «No manifesto», texto que surge a propósito da peça coletiva Parts of Some Sextets (1965) – é também um dos sinais performativos de que a imagem do espetáculo “pede” para ser repensada. A frase que nomeia esta peça icónica da Dança Pós-Moderna Americana e que convoca todo um período rico em discussões e em mudanças paradigmáticas, não só no meio da dança, mas nas artes e política em geral, continua hoje, a ecoar como tema. Nesta edição, sugerir que se use a “mente”, ou a ginástica do pensamento e da atenção, como músculo, pretende desafiar e valorizar as práticas artísticas experimentais e os seus processos, enquanto laboratórios de investigação e de pensamento crítico.
A pretexto da frase «The Mind is a Muscle», propomos interrogarmo-nos sobre os modos como as práticas performativas produzem pensamento. Como se inscreve esse pensamento concreto no trabalho, nos corpos, nas rotinas, na investigação, nas histórias, no arquivo? As máquinas de pensamento artístico, coreográfico, musical e performativo têm de facto relevância política? Como?
Este número duplo (#28-29) da revista Interact pretende recuperar uma série de discussões e de transformações que ocorreram no campo das práticas performativas, desde os finais do século XX, e às quais se associaram termos como pós-modernismo ou pós-dramático, dando conta de um estado da arte possível e actual neste campo. Neste número procuramos problematizar processos e modos de produção de pensamento que surgem a partir de práticas artísticas performativas.
A Interact é uma publicação digital editada pelo Centro de Estudos de Comunicação e Linguagens (CECL), atualmente integrado ICNOVA.
O seu objectivo é a reflexão e a discussão em torno de temáticas importantes do pensamento contemporâneo, o acompanhamento crítico de acontecimentos e práticas culturais e artísticas e o incentivo ao trabalho de experimentação com as tecnologias digitais e as redes de informação.
Diminuir o fosso ainda existente entre a cultura e a cibercultura é ainda uma das suas principais motivações, procurando por isso o encontro (e o confronto) entre práticas mais tradicionais no âmbito da cultura (como o ensaio, a crítica e a recensão), e práticas de expressão, de reflexão e de criatividade próprias à cultura digital, como as da hipertextualidade e hipermedia, interatividade e conetividade.