Professora da FCSH defende que o discurso de ódio “não é uma opinião” e atenta contra os direitos de liberdade humana. “Estamos a assistir a um cenário de degradação” da democracia.
“Vivemos em democracia, mas estamos a assistir a um cenário de degradação, que tem a ver com o facto de não se escutar ou respeitar o outro“, afirmou Marisa Torres da Silva, professora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova.
Marisa Torres da Silva, que falava na apresentação da iniciativa “7 Dias com os Media”, em Lisboa, vincou que o discurso de ódio “não é uma opinião” e atenta contra os direitos fundamentais da liberdade humana.
O discurso de ódio, conforme assinalou, tem na sua base uma série de intolerâncias, que podem estar ligadas a questões de género, idade, orientação sexual, entre outras.
Apesar de ressalvar que este tipo de problemas sempre existiu, a especialista notou que o cenário mudou nos últimos anos, com estes discursos a disseminarem-se com mais rapidez e a serem normalizados.
“O discurso de ódio é perigoso, provoca danos ao nível da ansiedade, bem-estar, autoestima, bem como danos ao nível social, perpetuando a estigmatização em relação a um determinado grupo”, referiu.
Na mesma sessão, Maria Inácia Rezola, que lidera a Comissão dos 50 anos do 25 de Abril, lembrou que o direito de voto foi alcançado devido à revolução, assinalando que a democracia é uma grande conquista de Abril.
A também professora universitária disse que a primeira eleição pós-25 de Abril contou com os votos de 92% dos portugueses, convidando a plateia, maioritariamente constituída por adolescentes, a ver qual será a taxa de abstenção das próximas eleições.
No debate, subordinado ao tema “Discursos de ódio e paz em tempos de guerra”, moderado por Francisco Sena Santos, o jornalista da RTP António Mateus recordou o período em que esteve na África do Sul, enquanto correspondente da agência Lusa.
Tínhamos uns briefings off the record [cuja Informação não pode ser citada] com Nelson Mandela, às sextas-feiras. Ele geria o país, como nós gerimos a nossa casa com os nossos filhos […]. Ele dizia-nos muitas vezes que o racismo não pertence a uma raça, mas a todas, tal como a xenofobia”, relatou.
O jornalista notou ainda que, em Portugal, são frequentemente misturadas opiniões com informação, ressalvando que a “mais-valia que um jornalista pode trazer” é dizer apenas aquilo que vê.
“Tenho que trabalhar da mesma forma com a pessoa que defende Putin, como com a pessoa que o odeia”, exemplificou.
A representar a Linha Internet Segura, um projeto da Associação Portuguesa do Apoio à Vítima (APAV), Tomás Grencho avançou que, entre 2021 e 2022, os discursos de ódio não representaram a maioria dos casos que chegaram a esta iniciativa, apesar de constituírem “uma grande fatia do bolo”.
Em 2022, a Linha Internet Segura recebeu 200 casos.
Os dados de 2023 ainda não estão fechados.
A operação “7 Dias com os Media” decorre entre 3 e 9 de maio, dedicada ao tema “Discursos de ódio e paz em tempos de guerra”.
Esta iniciativa, promovida pelo GILM – Grupo Informal sobre Literacia Mediática, vai debater temas como discursos de ódio nas redes sociais, limites da liberdade de expressão, responsabilidade individual na produção e partilha de conteúdos ‘online’ e inteligência artificial.
Em cima da mesa vão estar ainda temas como ética, os media na promoção dos discursos de paz, desinformação e propaganda e o poder das narrativas visuais na promoção dos discursos de paz.